Uma Sucinta Reflexão sobre o Verdadeiro Plano Real
- RICARDO GOMES RODRIGUES
- 30 de jun. de 2024
- 10 min de leitura

A Realidade do Sistema Financeiro
A realidade do Plano Real é muito mais complexa do que a história oficial relata.
Sair de 25% ao mês para 1% ao ano foi um desafio! Com rendimentos de 25% não havia competitividade, e as empresas nunca tinham prejuízos pois tinham retornos “garantidos” com reajustes quinzenais.

O Sistema Financeiro da época hiperinflacionária nadava de braçada, e o setor imobiliário era privilegiado na proteção contra a desvalorização dos preços. A construção civil prosperava junto com a valorização das propriedades devido as constantes desvalorizações dos preços

As empresas de informática proliferavam; não exatamente por que eram protegidas da competição externa, mas por que não havia o conceito de competição no mercado inflacionário Brasileiro, tendo espaço para todos nesse ambiente financeiro de remunerações quinzenais de 25% ao mês.
Os 25% de inflação eram uma média, as pessoas não sofriam remunerações de preços mensais dessa ordem, mas muito menos, talvez digamos de 10%. O que sobrava, (e era muito), significava lucro inflacionário.
Parecia que esse ambiente hiperinflacionário era o melhor dos mundos. Todos reclamavam desse descalabro inflacionário (da boca pra fora), mas todos lucravam, e a economia ia de vento em polpa com crescimento de 5-10% ao ano.
Só que na prática não havia de fato uma economia funcionando.
Não havia um rígido controle da contabilidade, já que a cada quinze dias, bumba, mais reajustes de 25% nos seus investimentos.
A Nova Realidade do Plano Real-Dólar
Bem, um dia acordamos e essa ciranda financeira tinha desaparecido (magicamente?).
E mais, tínhamos uma moeda ancorada no dólar que agora nos dava uma realidade de preços pareada com o resto do mundo.
Foi um orgulho só! A inflação de “súbito” tinha baixado para (olha só) 1% ao ANO! E a economia passou, lentamente, a funcionar dentro de certa realidade contábil, não havia mais reajustes automáticos nem de preços, nem de investimentos de 25% ao MÊS.

A euforia tomou conta dos primeiros dias do Real que foi, lentamente como um torniquete, trazendo as pessoas e as empresas à realidade “econômica”.
Essa nova realidade econômica bateu forte na competitividade das empresas, e no bolso das pessoas.
Os preços passaram a serem estáveis, mas os retornos dos investimentos também. Passou a ser muito difícil encontrar investimentos com retornos altos. Tudo era na base de 1% ao ano de uma economia estável.
A âncora cambial do dólar estava funcionando, mas era um torniquete para quem estava acostumado com 25% ao MÊS.
Os primeiros a serem atingidos foram os Bancos (Privados). Quebrou o maior Banco Privado da época. O Banco Nacional.
Sem as remunerações de 25% ao mês, a realidade econômica mostrou como os Bancos “cozinhavam” a contabilidade, e de como o lucro (inflacionário) evitava a competição.
Houve um escândalo na época, e o Banco Nacional foi fechado, ficando sob intervenção do Banco Central por vários anos. Levou muito tempo para as pessoas reaverem suas economias. Isso para aqueles que tinham montantes dentro dos limites do seguro garantido pelo Banco Central, o que passava disso, ia depender do que restava efetivamente dos ativos do Banco Nacional. Houve muitas perdas, e levou anos esse processo todo de liquidação do Banco Nacional.
A realidade das empresas
As maiores vítimas do Plano Real foram as empresas de informática, não porque eram protegidas da competição estrangeira, ou porque tinham tecnologia obsoleta, mas porque viviam numa irrealidade econômica sem competição com contabilidade criativa (cozinhando os livros contábeis).

As maiores empresas desse setor eram de propriedade dos próprios Bancos, (como a Itautec), por razões mais ou menos óbvias. Mas havia uma imensa quantidade de empresas que não só montavam equipamentos, mas também ofereciam consultoria para sistemas de hardware e software.
Com a realidade econômica dos 1% ao ano batendo forte, os livros contábeis passaram a ter que falar a verdade, e essa verdade começou a bater forte na competitividade desse ambiente das empresas de informática.
A principal questão que a hiperinflação encobria era a falta de competitividade das empresas, as quais, com lucros (inflacionários) de 25% ao MÊS não tinham competidores, havia espaço para todos. Qual o problema então? O grande problema é que sem competitividade não havia desenvolvimento tecnológico nem desenvolvimento de capacidades gerenciais ou técnicas.
Vejam, nesse ambiente de remunerações de 25% ao MÊS, a lógica do mercado era pelo mais barato possível para aumentar ainda mais o lucro inflacionário.
Ninguém se preocupava em melhorar a tecnologia ou empregar pessoas mais competentes. Nesse ambiente sem competitividade de tremenda irrealidade econômica, o que funcionava era o mais barato possível, já que os retornos absurdos de 25% ao mês cobriam qualquer diferença competitiva, quer seja por melhorias no desenvolvimento de produtos, quer seja no emprego de pessoas mais capacitadas com salários mais altos.
Essa ciranda inflacionária encobria uma lenta e inexorável destruição de toda a estrutura da economia Brasileira, já que seu pilar básico que deveria ser a competitividade, e a realidade contábil estavam arruinadas. A economia Brasileira em 1994 estava de fato arruinada. Só que os 25% de retornos financeiros ao mês, não apenas encobriam essa ruína econômica, mas davam as pessoas, e as empresas essa satisfação de ganhos (totalmente irreais).
As Duas Realidades Econômicas

A partir desse ambiente que estamos descrevendo, com retorno real de 1% ao ANO, e não mais 25% ao MÊS, a realidade se impôs e os livros contábeis passaram a falar a verdade. E a verdade era dura!
A economia Brasileira era, na verdade, subdesenvolvida sem tecnologia ou pessoal capacitado, já que ambos tinham sido inibidos por décadas de hiperinflação desde a época do Regime Militar, e do Brasil Grande Militarizado que ia para a frente crescendo a 10% ao ano.
Na verdade, havia duas realidades: uma das empresas privadas, e outra das empresas públicas, ou daquelas pertencentes à Bancos, quer sejam públicos ou privados.
Por décadas desse espírito hiperinflacionário, ambos os ambientes públicos e privados foram, como estamos percebendo, coniventes com essa irrealidade econômica de retornos inflacionários sem precedentes na história econômica.
Quando o 1% ao mês começou a bater forte, as empresas começaram a quebrar, e não havia empresas, tecnologia, ou pessoal capacitado para substituir essas que iam quebrando. Começou a invasão estrangeira de produtos, empresas e pessoal capacitado.
O Ambiente Militarizado da Época

Como disse antes, as empresas que havia no mercado da Itautec até a Petrobrás, passando pelo Banco Nacional ou Banco do Brasil, ou ainda, Embratel, Telebrás, ou ainda, Telesp e esse Universo de “Brás” ou “SP” alguma coisa, gosavam dessa mesma ineficiência protegidas pelo Estado Brasileiro Militarizado. Já que não quebravam; nem o Banco Nacional, Nem a Embratel, nem a Telesp, nem o Banco do Brasil, nem a Petrobrás, preocupavam-se com eficiência, que no máximo era vista dentro dessa ótica de engenheiro militar como um algoritmo ou função de otimização matemática pura. Economia era matemática. Daí o dialeto que ficou famoso na época do economês pomposo dessa equipe de professores formados em Harvard.
A bem da verdade, esse ambiente era controlado pela politicagem dos Generais com os políticos de plantão da direita até a esquerda. De Antônio Carlos Magalhães até Lula da Silva via General Golbery do Couto e Silva, e pelo General Geisel, que de Presidente da Petrobrás tornou-se Presidente do Brasil sem nunca ter sido eleito. Bem, foi eleito pelo Congresso em eleições para Presidente que eram indiretas durante esse regime militarizado de 1964 até 1984.
Geisel não pertencia a nenhum partido político, mas dos Generais Brasileiros. Geisel significou o ápice e a glória dessa época do regime militar, sendo recebido em Londres, desfilando em carruagem aberta com a Rainha Elisabeth.
A realidade da maioria das empresas Brasileiras era de que estavam quebradas, e de que estavam sendo acobertadas por uma economia também quebrada, vivendo num ambiente deteriorado de produtos porcaria que quebravam facilmente, ou não funcionavam direito, até linhas telefônicas que levavam meses até anos para serem instaladas. A lei de oferta e procura era uma tremenda gozação dos Generais Brasileiros que resolvia tudo no vai ou racha.
Os investimentos tanto públicos quanto privados eram tão irrealistas quanto todo esse ambiente econômico deteriorado dominado pela politicagem e pela hiperinflação.
Quando os retornos financeiros ficaram mais “realistas” no nível de 1% ao ano, a realidade econômica começou a bater forte, e esse castelo de cartas começou a ruir e veio a choradeira e a revolta.
O Ambiente Pós Plano Real

A quebra do Banco Nacional chocou a todos pela porcaria, beirando a criminalidade, com que gerenciava seus livros contábeis.
Depois veio a quebradeira das empresas de informática, que na verdade, como vimos antes, não tinham nem produto (tudo porcaria) nem pessoal qualificado (qualquer um entrava nesse segmento sem entender direito de nada, fornecendo sistemas de rede e consultoria em software).

No final, todos os segmentos da economia Brasileira sofriam imensamente para se adaptarem a essa nova realidade econômica (que era uma novidade) de retornos na faixa de 1% ao ano.
Entender essas novas “realidades” da economia do Plano Real é até hoje uma dificuldade tanto para o setor público quando para o privado no Brasil.
Entender a diferença entre ganhos de 25% ao mês, e 1% ao ano era, e ainda é, muito difícil para os Brasileiros porque é preciso entender a sutileza do que realmente significa a palavra competitividade. Ela significa melhor desenvolvimento tecnológico, melhores produtos e salários mais altos para pessoas mais bem qualificadas e, portanto, uma economia mais competitiva e saudável.

Como podemos perceber, a palavra competitividade econômica é ampla, e tem muitas ramificações e vieses, os quais eram sistematicamente obliterados pelo ambiente público e privado protegidos pelo Estado Brasileiro Militarizado de país que ia para a frente a todo vapor para se tornar superpotência.
Quando a realidade econômica bateu forte com o Plano Real com retornos na faixa de 1% ao ano, a caixa preta da economia Brasileira foi aberta, e descobriu-se aí o imenso “buraco negro” econômico em que vivíamos.
Nem empresas, nem produtos, nem pessoal qualificado. Apenas “empreguinhos” de baixa produtividade aonde as melhores remunerações iam para casta cívico-militar e seus amigos, parentes e cupinchas.
Pessoas mais qualificadas ou se adaptavam a mediocridade desse ambiente tanto público quanto privado, ou desapareciam na amargura, discriminação e violência da repressão do reinado desse cupinchanato cívico-militar.

Em certa medida, os aumentos prometidos dos benefícios de uma melhora na competitividade da economia Brasileira pelo Plano Real não se realizaram por culpa das relações espúrias entre as elites Yankees, e a casta cívico-militar brasileira, que eram, e ainda são, sustentadas através do jogo político de Washington para favorecer consultorias de Universidades Americanas que pouco entendem da realidade Brasileira, fazendo analogias descabidas entre o Brasil e os Estados Unidos, querendo que nossa história e nossa realidade se pareçam com a deles.
No contexto político Brasileiro atual, a “Americanização” da economia Brasileira pós Plano Real coloca ênfase da melhoria de nosso desempenho econômico nas eternas reformas, fiscais, da previdência etc., que demandam um tremendo esforço político para um ambiente agora mais democrático de eleições diretas para Presidente, até nessa insistência na redução de impostos ou nas participações público-privadas. Esquecendo-se que no próprio Estados Unidos existe limites claros entre o que é público e privado.
Saímos de uma economia meio comunista dos Generais Brasileiros, em direção a uma economia liberal de fachada que encobre um verdadeiro intervencionismo Americano, o qual, através de Universidades Americanas, tal como Harvard, fazem pregações que irrealista sobre a economia brasileira, agora bem mais arejada, sem entender o contexto da realidade do Brasil como um todo.

Essa pregação de redução de impostos, é um bom exemplo, que quer reduzir nossa História à História Americana, tentando reproduzir a visão histórica dos Estados Unidos, a partir da rebelião do Chá, que deu partida a independência Yankee. Nossa História não tem nada a ver com rebeliões ou revoltas, mas é uma sequência de continuidade histórica desde os Portugueses até a formação do Império do Brasil. Veja o vídeo no link abaixo.
A liberalização da economia Brasileira no pós Plano Real significou uma inserção forçada da economia brasileira na Globalização como uma economia agrícola, percebendo qualquer processo de industrialização como uma ameaça aos interesses geopolíticos yankees no Atlântico Sul. A bem da verdade claro que é. Mas, Os Estados Unidos vão ter que conviver com isso da mesma maneira que convivem com a China Comunista e a Federação Russa. Veja o vídeo sobre a geopolítica do Atlânticos Sul no link abaixo
Quem tem Olho em Terra de Cego e Rei
Minha estória pessoal reflete muito bem esse sucinto relato sobre o Plano Real.
Treinado nos Estados Unidos com pós-graduação na George Washington University (GWU) em Washington D.C., vinha com tudo, em meados dos 90, para ser parte desse pessoal mais qualificado do pós Plano Real.
Com o Plano Real minhas esperanças foram renovadas. Ledo engano! Como em terra de cego que tem olho é rei, passei a ser malvisto por esse cupinchanato da casta cívico-militar. Embora me vissem como mais capaz, eu não me submetia a “normalização” que essa casta gerencial, principalmente militar, queria impor para que o “sistema” cívico-militar continuasse a funcionar mesmo no pós Real do Brasil mais competitivo.
Vocês vêm, minha posição era complicada e eu não percebia.
Cada vez que abria a boca eu estava certo e eles errados. Eles sabiam disso, mas o medo e a inveja dos menos capazes e não competitivos, normalizava tudo para o nível da mediocridade brasileira tanto no setor público quanto no privado.
Eles não viam dessa maneira por que entendiam competitividade não como o posicionamento dos melhores nas empresas, mas como o posicionamento dos mais privilegiados através de sua cadeia de relacionamentos (cupinchanato).
Essa era, (e ainda é), a lógica da casta cívico-militar confundir competitividade com distribuição de privilégios através de sua rede de relacionamentos e favorecimentos (cupinchanato). Essa ideia é reforçada pelas consultorias das Universidades Americanas que operam no Brasil tal como Harvard, que sistematicamente relega brasileiros para estabelecerem laços gerenciais e políticos com a casta cívico-militar (cupinchanato).
Com a ajuda dos Estados Unidos, a casta cívico-militar se perpetua no poder, e a competitividade da economia brasileira se reduz ao setor agrícola dominada por Bunge, Cargil, e fornecedores Yankees ou europeus de kits de sementes elaboradas, e outras técnicas agrícolas.
No setor industrial, predominam as maquiladoras, nos forçando a importar caixas pretas das mais diversas tecnologias, tornando as Universidades Brasileiras totalmente irrelevantes no nosso desenvolvimento tecnológico.
Como um país de 200 milhões de pessoas como o Brasil, não pode prescindir de desenvolvimento industrial e, portanto, tecnológico, assistimos a essa desindustrialização que vai lentamente destruindo o tecido social de nossos grandes centros urbanos, principalmente Rio e São Paulo.

O objetivo dos Americanos é colocar consultores Americanos ou estrangeiros para suprir a óbvia ineficiência da economia Brasileira no setor de pessoal. Essa aliança da casta cívico-militar com os Yankees põe de lado os brasileiros mais competitivos. É assim até hoje. O General se aposenta e torna-se Senador, o capitão carioca se aposenta e torna-se Governador do Estado de São Paulo sem nunca ter tido qualquer relação política com nosso Estado.
Pelo Prof. Ricardo Gomes Rodrigues
São Carlos, SP, 29 de junho de 2024.
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