A Natureza dos Processos Revolucionários
- RICARDO GOMES RODRIGUES
- 20 de fev. de 2021
- 7 min de leitura
Atualizado: 7 de dez. de 2023
Os Processos Revolucionários
Os processos revolucionários se parecem e sua natureza está assentada em uma imensa campanha moralizadora contra o “ancien regime” como uma forma de virar a página da história de um país e sair adiante para um futuro inovador.
Para além dessa natureza moralizadora e renovadora, os processos revolucionários se distinguem pelos acontecimentos de sua época.
A Revolução Francesa foi pela derrubada da monarquia e a ascensão de uma república de méritos e competências através de uma nova ordem social inovadora pelo sufrágio universal e a emancipação e a diversificação das classes sociais com o predomínio do conflito da ascensão social.
A Revolução Russa optou pela derrubada da monarquia e a ascensão de uma república sem classes sociais através de uma ordem social inovadora pela destruição de todas as classes sociais com o predomínio do proletariado através do discurso dialético do conflito social sem fim.

O Discurso Dialético
Desde o final do século 19, o discurso do conflito social pela dialética dos menos favorecidos contra os mais favorecidos têm sido a tônica das revoluções e das mobilizações populares que têm posto fim a regimes políticos, consagrando as aspirações justas do conflito e da ascensão social.
A verdadeira natureza do discurso dialético começa com a Revolução francesa e deságua na revolução de outubro de 1917. Desde então, o mundo entrou num frenesi de mortes e destruições na tentativa de erradicar a ordem das classes sociais e construir um Estado laico e pagão sem aspiração de mobilidade social, ditando uma narrativa de conflito social permanente em prol de certas lideranças em estado de “revolução”.

Dois Modelos e uma mesma causa
Então, a partir de 1789 a natureza revolucionária, tanto Francesa quanto russa, tem seguido essa orientação do conflito social; uma pela mobilidade entre classes e outra pela erradicação das classes sociais, e ambas no final, tendo como ponto em comum o conflito social sem fim.
É óbvio que depois de mais de 200 anos esses dois modelos se exauriram, principalmente, por que acabaram tendo uma mesma causa em comum inescapável: o discurso dialético.
A evolução desses dois modelos, pode-se observar desde o triunfo da revolução norte americana em 1776 e suas consequência na Paris de 1789 até que, depois de 20 anos de guerras napoleônicas, o desprestígio da causa republicana tornou-se evidente, promovendo uma volta da velha ordem monárquica, o que iria predominar até 1914 com a Primeira Guerra Mundial.

A Guerra Civil Norte Americana – Uma questão de família
A Guerra Civil Norte Americana revive o processo revolucionário republicano de 1776, levando a destruição da ordem social aristocrática do “velho sul”, a qual replicava de uma certa forma as mesmas questões de família que regiam os ideais monárquicos de então; Deus e a família.
A derrota dos Estados Confederados impulsionou a reconstrução dos ideais da República Norte-Americana através de uma retomada dos princípios da Revolução Francesa e do gerenciamento do conflito da mobilidade entre classes sociais.
Então, a verdadeira questão da guerra Norte Americana da Secessão não foi a abolição da escravidão, a qual foi usada como desculpa, mas a questão fundamental foi a da constituição dos valores de família; quando cai a velha ordem das famílias sulistas em prol do Estado laico e pagão baseado em méritos e no “império” da lei.
A consequência imediata foi a transformação da República numa ação política imperialista “justificada” pelas necessidades de mobilidade, ascensão social e progresso econômico contínuo da sociedade norte-americana (tão somente).

O que se observa depois de mais de 200 anos desde, digamos 1776, é uma notável convergência dos ideais revolucionários tanto da visão yankee de mobilidade social quanto da erradicação das classes sociais da natureza marxista. Então, é nesse processo que ambos em suas naturezas de conflitos sociais permanentes se encontram e se exaurem.
O avanço do neoliberalismo das elites yankees de Boston, Nova York e Wall Street só foi possível através da cooptação de ambas as esquerdas e as direitas norte-americanas por financistas depravados que tiranicamente imaginaram o futuro do mundo através de uma ordem social perfeita; uma mescla; uma síntese da questão da mobilidade social com os ideais marxistas de uma única classe social, e tiveram em Bill Clinton, Tony Blair, Fernando Henrique Cardoso e Lula da Silva seus mestres dos disfarces.
Assim, dissolveram questões válidas da antiga república do bem-estar social do pós-guerra numa amálgama que resultaria no triunfo final da história do Estado laico e pagão sem classe sociais, família, religião ou pátria com valores possíveis apenas para aqueles passíveis de serem negociados na bolsa de Wall Street.
Dessa forma, a união do “capitalismo” e do “socialismo” se deu através da simbiose econômica entre os Estados Unidos da América com a China Comunista, transfigurando o outrora triunfante parque fabril norte-americano em maquiladoras chinesas.
O conflito social foi sendo mantido permanentemente através da destruição das maiorias e do estímulo de questiúnculas sociais pornográficas e bizarras e, acima de tudo, da destruição da velha ordem social representada pelos tradicionais valores de famílias, trazendo para baixo com isso a mobilidade social, já que a base das escalas de ordem social é a própria família e sem ela os financistas depravados de Wall Street definiram uma sociedade sem classes, unindo os Estados Unidos da América com a China Comunista, ambos, agora apenas baseados em ordens sociais pornográficas e bizarras sem Deus ou valores de família.
Assim, houve como uma espécie de retorno as mesmas questões de família que haviam originado a guerra de secessão nos Estados Unidos.

A Crise do modelo de convergência Sino-Americano – A Rebelião das Massas
Esse modelo de convergência capitalista-socialista com a dissolução das questões da mobilidade social pela extinção das classes sociais entra em crise pelas mesmas razões que as criaram, ou sejam, sem mobilidade e com uma imensa estratificação social.
O resultado tem sido a rebelião da classe média que se vê, em todo mundo, espremida entre salários exíguos e incertos e o desemprego; entre financistas neoliberais canalhas e as elites ideológicas (ambas de direita e esquerda) igualmente canalhas, agora, participantes do mesmo jogo viciado das atuais convergências políticas de direita e esquerda.
Com o objetivo de manter a classe média em cheque, iniciou-se um processo de “reformas” sem fim do Estado; quer seja para reduzir impostos; quer seja para reduzir benefícios sociais; quer seja para perpetuar a precariedade social. Com o fim do Estado do Bem Estar social, atingiu-se a classe média que agora vê com suspeita essas alianças entre lideranças financeiras e lideranças políticas de direita e esquerda, levando ao descrédito e a decrepitude do modelo e a sua transformação em “ancien regime”, entrando, portanto, em uma fase pré-revolucionária de descrença, em ambos, o modelo econômico e o regime político.

A fase pré-revolucionária – A Revolta da Classe Média
Se com o modelo de convergência descrito antes, os financistas de Wall Street esperavam criar uma nova ordem social mundial perfeita isenta de revoluções estavam errados. Prevalece, então a verdadeira natureza das revoluções, ou seja, a necessidade de moralização e renovação de um sistema em decrepitude.
Sob o ponto de vista econômico não há como a classe média ter mobilidade social e ganhos de renda e produtividade sem industrialização.
O caso do Brasil é exemplar, ganhos extraordinários com commodities nos últimos 20 anos nos servem apenas para equilibrar as contas externas e acumular imensas reservas cambiais, estabilizando a moeda nacional para poder apenas fazer o país servir como mercado de reserva para as quinquilharias yankees produzidas na China Comunista. Mas agora com 200 milhões de habitantes não podemos fugir de um projeto nacional de desenvolvimento industrial e tecnológico.
O caso europeu é semelhante, um continente com clima ruim superpovoado com 300 milhões de habitantes, sem indústrias, e padecendo com eternas reformas econômicas e alto desemprego crônico. A revolta dos coletes amarelos franceses é o prenúncio dessa tão falada revolta da classe média.
A crise econômica do Modelo de convergência Sino-Americano
O pano de fundo da atual crise econômica mundial está no vertiginoso crescimento econômico chinês, passando de uma sociedade feudal e extremamente subdesenvolvida para uma outra altamente industrializada em apenas 30 anos. Continuam válidas as questões dos ciclos econômicos; tão rápido se vai pra cima; se vai para baixo, transformando 35 anos de ouro de espetacular crescimento em outros tantos de crescimento vegetativo ou negativo.
E as consequências são imensas. Países como a Suécia, por exemplo, que apostaram tudo nesse modelo, tornando-se extremamente dependente do comércio exterior, em uma situação de crise depressiva como a que estamos vivendo agora no mundo, eles ficam sem alternativas.

O Deus da revolução
A questão revolucionária principal nessa atual circunstância histórica tornou-se, principalmente, a decrepitude desse modelo de convergência social sem classes, sem mobilidade, sem família e sem um Estado de bem-estar social.
A questão subjacente é a sobrevivência do próprio Estado Laico. Apenas um conjunto de leis não é suficiente para se estabelecer ordem social estável.
O próprio Estado tem se mostrado transitório ao longo do tempo. O que tem se mostrado mais perene na história humana tem sido a família; é ela que sempre tem vindo em socorro do indivíduo; é a ela que o indivíduo pode sempre contar nos dias de dificuldades para promover seu bem-estar e sua sobrevivência.
A outra questão é de como saímos desse modelo pornográfico e bizarro neoliberal yankee de convergência social capitalista-socialista. O exemplo talvez venha da própria Rússia a qual saiu do comunismo, reformulando-se e resgatando sua história social, política e religiosa.

Epílogo
Como podemos perceber através desse sucinto relato, as revoluções podem ter na origem a mesma natureza moralizadora e renovadora, mas podem ter caminhos e processos de desenvolvimento social muito diferentes.
Então, a questão do discurso dialético e de seu permanente conflito social não é, como podemos observar, a única motivação e fonte para a ruptura de sistemas arcaicos, os quais geram os processos revolucionários.
Hoje, paradoxalmente, assistimos à exaustão do discurso dialético e da consequente pasteurização da mobilidade social com a extinção das classes sociais através de valores sociais bizarros e, portanto, o processo revolucionário se repete pois que o presente regime social, político e econômico decaiu em severa decrepitude, transformando-se em “ancien regime”.
A conclusão final é de que a tônica não é o grau de violência, ou o grau do conflito social embutido nos processos revolucionários, o que inegavelmente existe com seus dolorósos efeitos colaterais, mais sim, a premência e a magnitude das crises sociais promovidas por regimes em descenso.
Nesse caso, a natureza do conflito social que motiva as revoluções é circunstancial, já que sua verdadeira motivação é a moralização e a renovação da sociedade em outros termos, e esse processo tem ocorrido frequentemente através dos tempos aonde civilizações aparecem e se desvanecem, e no final apenas nos restam Deus e a família.

Professor Ricardo Gomes Rodrigues
São Carlos, SP, Brasil
14 de abril de 2019
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